Reprodução O primeiro livro publicado por Monteiro Lobato foi uma série de relatos sobre o saci-pererê. A partir daí, o personagem acabou ganhando destaque na maioria de suas histórias |
Têm origem indígena. Ou africana. Ou portuguesa. Ou as três misturadas. As histórias foram passadas oralmente, de pai para filho desde o tempo do descobrimento - ou até antes dele, no caso dos índios - e foram sofrendo modificações ao longo dos anos.
Hoje, um mito nascido no Amazonas tem versões modificadas ou totalmente diferentes no Sudeste, no Sul e no Nordeste. Caso da Mãe d'Água, índia-sereia na região Amazônica, e sereia-branca na região do São Francisco. Ou da boitatá, cobra de fogo surgida da escuridão no Norte, e de comer olhos de bicho no Sul durante um grande dilúvio.
O fato é que, não importa sua origem, as histórias desses seres fantásticos, com poderes sobrenaturais, continuam encantando crianças e adultos. Mesmo que sejam histórias profundamente moralistas, como a da mula-sem-cabeça, ou histórias só para assustar, como a do Mapinguari.
10. Saci Pererê
Insttituto Moreira Salles/Monteiro Lobato/Reprodução Ilustração do saci feita por Monteiro Lobato |
"- Mas que reinações ele faz? – indagou Pedrinho."
"- Quantas pode – respondeu o negro. – Azeda o leite, quebra a ponta das agulhas, esconde as tesourinhas de unha, embaraça os novelos de linha, faz o dedal das costureiras cair nos buracos. Bota moscas na sopa, queima o feijão que está no fogo, gora os ovos das ninhadas.
Quando encontra um prego, vira ele de ponta pra riba para que espete o pé do primeiro que passa. Tudo que numa casa acontece de ruim é sempre arte do saci. Não contente com isso, também atormenta os cachorros, atropela as galinhas e persegue os cavalos no pasto, chupando o sangue deles. O saci não faz maldade grande, mas não há maldade pequenina que não faça."
(Trecho de "O Saci", de Monteiro Lobato)
Monteiro Lobato foi o primeiro escritor a descrever o saci-pererê na literatura. Primeiro, em 1918, na transcrição de relatos que colheu da gente do interior de São Paulo sobre a "aparição". Depois, na forma de livro documentando esses relatos - "Saci-Pererê: Resultado de um Inquérito".
Foi o primeiro livro de Monteiro Lobato. O escritor era tão fascinado pelo saci que o tornou personagem recorrente nas aventuras de Pedrinho, Narizinho, Dona Benta, Tia Anastácia e Emília. Mais tarde, quando as histórias da Turma do Sítio do Pica-Pau Amarelo foram adaptadas para a televisão, em meados dos anos 70, o saci acabou se transformando em um dos personagens mais carismáticos do folclore brasileiro.
Mas a figura do negrinho buliçoso nasceu no final do século 18, início do século 19, como um dos melhores exemplos de convergência, segundo Luís da Câmara Cascudo. Os elementos que compõem o personagem vêm de várias paragens. Seu nome vem de uma ave, o saci (Tapera naevia). A carapuça vermelha, com poderes mágicos, é citada pelos romanos (o pileus do íncubo capaz de dar riqueza e poder a quem conseguir pegá-lo). O negro travesso, que troça de todos, aparece no folclore português.
O saci-pererê é comum no folclore do Sul e Sudeste do Brasil. Para muitos, ele é uma entidade maléfica. Para outros, uma entidade graciosa e zombeteira. Mas é crença comum que o saci anda pelado por aí, pulando numa perna só, que aparece e desaparece dentro de um redemoinho de vento, que se anuncia pelo assovio persistente, misterioso, inlocalizável e assustador, e que não atravessa água - como outros seres encantados.
Se alguém quiser capturar um saci, basta jogar no pé-de-vento uma peneira de cruzeta emborcada, dessas com duas taquaras mais largas que se cruzam bem no meio dela. O saci fica preso sob a peneira, e deve-se colocá-lo depois dentro de uma garrafa tapada com uma rolha com uma cruz desenhada. Antes, porém, é preciso tirar a carapuça dele e escondê-la muito bem.
9. Negrinho do pastoreio
"- Foi por aí que eu perdi... Foi por aí que eu perdi", assim a gente do campo, colocando uma vela sob uma árvore ou junto a um moirão, pede ao Negrinho do Pastoreio que encontre um objeto perdido. A crença de origem afro-cristã nasceu nos tempos da escravidão, nos pampas gaúchos, e retrata a violência dos senhores de escravos. É uma lenda regional e moral - o Bem contra o Mau.Reza a lenda que um estancieiro rico, muito mau e sovina, deixava aos cuidados de um menino escravo um cavalo baio rápido como um foguete. Certo dia, o estancieiro apostou que seu baio faria o árabe do vizinho comer poeira numa carreira de 300 metros. No dia marcado, os dois cavalos disputavam cabeça a cabeça, até que, a poucos metros da linha da chegada, o baio do estancieiro estancou e quase atirou o negrinho ao chão. Enfurecido, o estanceiro desceu o relho no moleque e mandou-o para o campo pastorear o baio e os tordilhos dia e noite, por 30 dias.
Passados alguns dias, o menino estava desesperado. Cansado, com frio e com fome, acabou adormecendo sob uma árvore e, quando acordou, os cavalos haviam sumido. Voltou para a sede da fazenda já temendo o pior. Quando contou ao senhor que tinha perdido os animais, tomou outra surra de relho. E o estancieiro lhe disse que não voltasse sem os cavalos. O menino procurou, procurou, procurou e nada. Pediu então ajuda à sua madrinha, a Virgem Nossa Senhora, e encontrou os cavalos. Antes de voltar para a fazenda com a tropa, parou para descansar.
Mas o filho do senhor, que seguia o mesmo caminho do pai nas maldades, encontrou o negrinho, soltou os cavalos e correu para contar ao estancieiro que o menino estava fazendo corpo mole. O negrinho acordou embaixo de pancada, e novamente o estancieiro mandou dar-lhe uma surra até que a carne despregasse dos ossos e o menino não emitisse som algum. Para economizar a enxada da cova, mandou jogar o corpo do menino num formigueiro.
Três dias depois, o estancieiro resolveu passar no formigueiro para ver se as formigas já tinham devorado tudo. Caiu de joelhos ao ver o negrinho em pé, sobre o formigueiro, com a pele limpa, ladeado pela tropa de cavalos perdidos e pela Virgem Nossa Senhora. O Negrinho olhou para o senhor, montou no baio, riu-se e saiu pastoreando a tropilha. Desde então, o Negrinho do Pastoreio anda à procura de objetos perdidos, colocando-os de jeito para serem achados pelos donos quando estes acendem um coto de vela, cuja luz ele leva para o altar da Virgem Nossa Senhora. Por isso, se você perder algum objeto, acenda uma vela pro Negrinho e peç ajuda. Se ele não achar... ninguém mais acha.
8. Mula-sem-cabeça
© 2010 ComoTudoFunciona/Geisa C. Souza
O barulho de seu trote é tão ensurdecedor (ela tem ferraduras de prata), que pode ser ouvido a quilômetros de distância. Nas noites da mula-sem-cabeça, ninguém põe os pés para fora de casa, com medo de topar com ela. Se não der para fugir do encontro, o jeito é deitar-se no chão sem encarar o bicho, esconder unhas, dentes e qualquer coisa que brilhe e que possa atrair a atenção da criatura.
Nessas regiões, todos sabem que a mula - ou burrinha - é uma mulher que foi amaldiçoada por Deus por dormir com um padre dentro de uma igreja católica. Dizem que para desfazer o encantamento, é preciso picar a mula-sem-cabeça com uma agulha ou alfinete ou tirar o arreio de ferro da boca da criatura. Mas, se ela não tem cabeça, como seria possível arrancar o arreio? E quem teria coragem suficiente para chegar perto do bicho para picá-la ou para procurar entre as labaredas o pedaço de metal de sua boca? Ao que se sabe, ninguém ainda tentou.
Os primeiros registros de aparições da mula-sem-cabeça datam do início do período colonial, no século 16. Acredita-se que o mito tenha sido trazido para o Brasil pelos portugueses, e para o restante da América Latina pelos espanhóis. Há relatos da presença na mula na Espanha, na Argentina e em outros países da América do Sul.
A aparência da mula varia de região para região. Há quem diga que ela é marrom, e há quem jure que o bicho é preto e tem uma cruz branca no peito. A transformação da mulher em mula acontece numa encruzilhada. Logo depois que se transforma, sai pelos campos matando o gado, assustando as pessoas e destruindo o que vê pela frente. Segundo alguns relatos, a viagem começa e termina no povoado onde o pecado foi cometido. E a mula-sem-cabeça pode, ainda, transmitir sua maldição para outras mulheres pecadoras.
Alguns estudiosos defendem que a maldição da mula é uma forma que a Igreja católica do Brasil colônia arrumou de desencorajar o adultério. É, portanto, um mito moralista. A pecadora amaldiçoada por Deus só pode voltar à forma humana temporariamente - não importa a maneira como isso se dá: por picada de agulha, amarrando-a a uma cruz ou tirando-lhe as rédeas. Enquanto o benfeitor estiver vivo ou morando no povoado, ela não mais se transforma.
Mas basta o benfeitor morrer ou "picar a mula" para outras paragens que a pobre mulher volta a se transformar. A menos, é claro, que se case com o benfeitor em agradecimento. Ou que o padre de quem é amante a amaldiçoe sete vezes antes de celebrar uma missa.
7. Lobisomem
Sete povoados, sete cemitérios de igrejas, sete outeiros, sete encruzilhadas, sete partes do mundo. O lobisomem brasileiro faz essa peregrinação sempre que se transforma. Ele começa a corrida à meia-noite e termina às duas da manhã. A maldição é moral. Nasce-se lobisomem, e, não, fica-se lobisomem. Estão fadados a se transformar em lobisomens os filhos de incestos ou o filho que nasceu depois de uma série de sete filhas.Em geral, os lobisomens são muito brancos, magros, pálidos, de pele macilenta, orelhas compridas e nariz levantado. A primeira transformação se dá aos 13 anos de idade e, a partir de então, toda terça e sexta-feira, não importa a lua. O lobisomem brasileiro não sai atacando as pessoas. Ao transformar-se ele sai para cumprir a sina de percorrer os povoados, os cemitérios, as encruzilhas, sempre terminando no ponto de partida e sempre o mais rápido possível para dar conta de fazer tudo em duas horas.
Para quebrar a sina do lobisomem é preciso coragem. Você deve chegar bem perto do bicho sem que ele perceba e bater-lhe forte na cabeça. Mas é preciso ter cuidado para não se sujar com o sangue do lobisomem. Caso contrário, quem vai ter de fazer loucas corridas às terças e sextas transformado em lobo é você.
6. Curupira
Demônio das florestas. É assim que os índios tupis chamam o Curupira, um anão de cabelos vermelhos, dentes verdes ou azuis e pés virados para trás que protege as árvores e os bichos das matas brasileiras. Na verdade, ele não é um anão. É um menino baixinho. Tanto que seu nome deriva das palavras curumim e pira e significa corpo de menino.A aparência do Curupira varia de região para região, mas não a sua estatura - apenas quatro palmos. No Pará, por exemplo, o Curupira é descrito como sendo calvo e com o corpo coberto de pelos, sem orifícios para as secreções. No Acre, a criatura tem cabelos revoltos, para cima.
Quando pega um caçador maltratando um animal ou uma árvore, cobre-o de pancadas, chegando a matar às vezes. Para proteger a natureza, o Curupira usa mil artimanhas. Com gritos, assovios e gemidos, ele ilude e confunde os caçadores, fazendo com que eles o sigam pensando que estão atrás de algum animal. Quando se dão conta, estão perdidos na mata.
O Curupira ainda apaga os rastros deixados pelo caçador, deixando suas pegadas ao contrário no lugar. E o incauto que cai na do Curupira nunca mais encontra o caminho de volta. Alguns caboclos costumam deixar presentes no caminho da mata (cachaça, comida sem pimenta nem alho) para distrair ou agradar o Curupira.
(José de Anchieta, São Vicente)
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Se alguém vir o Curupira correndo as matas batendo nos troncos das árvores com um machado feito de casco de jabuti, com o calcanhar ou com o imenso pênis, pode se preparar porque lá vem tempestade. Sempre que a chuva forte se aproxima, o Curupira dá uma pancada no tronco das árvores para ver se elas estão fortes o suficiente para aguentar a ventania. Quando percebe que a árvore não vai resistir, ele avisa os animais para não chegarem perto.
O Curupira é um mito totalmente brasileiro, que não tem qualquer influência dos portugueses colonizadores. Estes quando aqui chegaram depararam com o medo que os índios tinham dessa criatura. Em 1560, José de Anchieta enviou cartas para a Coroa falando dos ataques da criatura de cabelos de fogo (veja quadro ao lado).
O Curupira é frequentemente confundido com outro mito puramente brasileiro, o caipora. Leia para saber o porquê.
5. Caipora
Reprodução Jangada Brasil/ Marcos Jardim
O Caipora é geralmente confundido com o Curupira, mas ele não tem os pés voltados para trás e anda montado em um porco enorme
Também protetor das florestas e dos animais, o Caipora é geralmente confundido com o Curupira. Mas trata-se de uma criatura totalmente diferente e cuja aparência varia em todo o Brasil. Ele anda montado em um caititu, uma espécie de porco de enormes proporções, e segura um cajado feito de galho de jacapenga. No Sul do país é um gigante coberto de pelos pretos dos pés à cabeça.
No Norte e Nordeste, um ser pequenino, indiozinho, muito escuro e com olhos cor de brasa, ágil e nu em pelo - ou vestindo uma pequena tanga. Em Pernambuco, ele tem um pé só. Em Minas Gerais, um olho só. Na Bahia pode ser uma cabocla, um negro ou um negrinho.
Não importa a região e a aparência, o Caipora aparece sempre como protetor da natureza. O nome significa habitante do mato e vem do tupi-guarani: caa (mato) e pora (habitante, morador). Chamado por alguns de duende e por outros de demônio, a criatura mora dentro de um tronco de árvore no fundo da floresta. Adora cachaça e fumo e costuma fazer tratos com caçadores, exigindo sangue humano nos contratos.
Deixa-os matar a caça - exceto às sextas-feiras -, mas mata-os se não cumprirem o acordado. Quando encontra algum animal morto por caçadores sem a sua permissão, o Caipora pode ressuscitá-lo - poder que o Curupira não tem. O Caipora devolve a vida ao animal encostando-lhe o focinho de seu porco ou o cajado de jacapenga, ou, ainda, ordenando que ele ressuscite.
E só para constar, o Caipora tem os pés normais. O que não acontece com nosso próximo personagem.
4. Mapinguari
O Mapinguari até poderia ser uma mistura de Curupira com Caipora. Mito do Amazonas, Acre e Pará, a criatura é um gigante peludo com os pés voltados para trás, as mãos com garras afiadas e uma boca vertical que sai do nariz e vai até o estômago. Em algumas regiões, diz-se que o Mapinguari tem um único olho, enorme, no meio da testa.Em outras, que ele tem duas bocas - uma no lugar normal e outra, enorme, na altura do estômago. Seus pelos avermelhados são tão espessos que o tornam à prova de balas - exceto na região do umbigo, a única parte vulnerável da fera.
Mas o Mapinguari, ao contrário do Curupira e do Caipora, não tem objetivos nobres na vida. Ele não protege as florestas nem os animais. O negócio dele é devorar os homens, de quem é inimigo ferrenho. Não come o corpo todo, apenas a cabeça, que enfia na bocarra e arranca de uma vez.
No Acre, acredita-se que o Mapinguari derive de índios que, chegando a uma idade avançada, transformaram-se no monstro. Mas tirando a boca vertical, a aparência do Mapinguari se assemelha muito à de um bicho-preguiça adulto, na descrição de quem já topou com a criatura e saiu vivo para contar a história.
Talvez por isso, muitos acreditem tratar-se de remanescente da preguiças gigantes que habitaram a região amazônica no Pleistoceno e que teriam sobrevivido devido à abundância de alimentos e à proteção das árvores cerradas da floresta amazônica.
3. Boto
© 2010 ComoTudoFunciona/Geisa C. Souza |
Nessas noites, o boto sai da água, transforma-se em homem bonito, forte, alto, sedutor e de boa proza, veste-se de branco, coloca um chapéu na cabeça para esconder o orifício por onde respira, e sai à procura do baile, onde bebe, conversa, namora e encanta as mulheres com seu jeito de dançar.
Sim, o Boto-moço é um verdadeiro pé de valsa, e ao seu gingado não resistem as casadas, as donzelas ou as viúvas. Antes da madrugada, pula na água e volta a ser boto. Não sem antes marcar com as moças que conheceram no baile encontros futuros, aos quais comparecem fielmente e dos quais elas geralmente saem grávidas.
A crença no Boto é tão grande que, em algumas comunidades ribeirinhas do Pará, quando a mulher pula a cerca e engravida do amante, põe a culpa no Boto e ninguém contesta. Nem mesmo o marido traído, que sabe ser impossível resistir aos encantos do bicho. Até bem pouco tempo atrás, os homens saiam à caça dos botos para matá-los e arrancar-lhes os olhos, as nadadeiras, as barbatanas, as genitálias e fazer com elas amuletos do amor e da sorte. Do amuleto feito do olho seco e preparado por um pajé, diz-se que é capaz de fazer qualquer moça se enamorar daquele que o possui.
Mas o Boto não é apenas um malandro sedutor que não quer saber dos filhos que faz. Na sua forma original, ele é um animal que protege embarcações, levando-as para local seguro em dia de tempestade, ajuda pescadores, levando os cardumes de peixes para junto das margens do Amazonas, e salva náufragos, conduzindo-os para terra firme.
E se você estiver navegando pelo Amazonas e vir um cardume de botos seguindo um barco, pode ter certeza que dentro dele há mulheres grávidas ou em período fértil. Porque o Boto, além do gingado irresistível, tem um faro que ganha de qualquer cão perdigueiro.
2. Mãe-d'água (Iara)
© 2010 ComoTudoFunciona/Geisa C. Souza |
Diz a lenda que a Mãe d'Água é a versão feminina do Boto, que também gosta de um arrasta-pé e de seduzir os homens em terra, com sua beleza e boa conversa, e na água, com seu canto maravilhoso. Para alguns, ela é uma índia de olhos verdes, cabelos negros lisos e longos, de uma beleza estonteante. Para outros, ela é branca e loura, de olhos claros e igualmente linda.
A origem do mito varia do Amazonas para o São Francisco. Na região da Amazônia, a Mãe-d'Água é conhecida como Iara (do tupi uiara). Filha preferida de um pajé, que em tudo a elogiava, ela matou em defesa própria os dois irmãos invejosos que haviam tentado matá-la e, com medo de contar ao pai, fugiu.
O pai então resolveu caçá-la e quando a capturou, jogou-a no encontro dos rios Solimões e Negro. Iara ressurgiu como sereia numa noite de lua cheia, encantando quem passasse com sua beleza e sua voz. Homens que escutam seu canto se apaixonam e se atiram no rio e, quando chegam ao fundo, são devorados por ela.
Na região do São Francisco, a Mãe d'Água é uma sereia nascida no rio. Ela aparece quando o rio dorme, todas as noites, à meia-noite. Durante dois ou três minutos, o velho Chico para de correr, as quedas d'água param de cair, os peixes deitam-se no leito do rio e os afogados seguem para as estrelas.
É quando a Mãe d'Água vem à tona, procurando um banco de areia ou uma canoa para pentear os longos cabelos, cantando uma música muito bonita e atraindo para as águas aqueles que se atrevem a incomodar o sono do rio nesse pequeno intervalo de tempo.
Por isso, os barcos que têm de navegar na hora morta do rio, costumam colocar uma carranca na proa para afugentar a Mãe d'Água e escapar da sina do afogamento.
Mas se carrancas do São Francisco são capazes de afugentar a sereia brasileira, o mesmo efeito elas não têm sobre uma outra criatura do folclore brasileiro.
1. Boitatá
Marcelo Xavier / Reprodução Versão do ilustrador Marcelo Xavier da boitatá, ou cobra-de-fogo, para o livro "Mitos - O Folclore do Mestre André" |
Em 1560, José de Anchieta escreveu que a cobra de fogo era a assombração mais temida pelos índios. Os negros escravos tinham sua própria versão da boitatá. Diziam a que "biatatá" era um ser que habitava as águas profundas e que saía à noite para caçar.
Em algum momento, os dois mitos convergiram, e hoje o boitatá é uma cobra que habita tanto as águas profundas quanto as campinas, tem olhos de fogo e parece ser feita de chamas azuladas. Em algumas regiões, a criatura protege as matas de incêndios, apagando o fogo quando passa.
Em outras, ela é um ser maligno, que ateia fogo na mata. O surgimento da criatura, no entanto, ainda é desconhecido. A história mais conhecida é a que é contada no Rio Grande do Sul.
Lá, a boitatá teria surgido durante um dilúvio, durante um período de grande escuridão. A boiguaçu, uma cobra muito grande, dormia na escuridão de sua caverna quando foi surpreendida pelas cheias. Para não morrer afogada, procurou, assim como os outros animais, um local elevado. O tempo passou, e a água não baixava. Todos os animais estavam fracos de fome, e a cobra resolveu matar a sua fome comendo-lhes os olhos - sua parte preferida.
À medida que ia comendo, a luz dos olhos das vítimas iam iluminando seu corpo, e a pele, muito fina, ia deixando transparecer essa "luz interior". Mas os olhos não tinham substância, e a cobra acabou morrendo de fome. Dizem que o que vaga cintilando na noite é o espírito da boiguaçu. Já outros, que trata-se de fogo-fátuo, fenômeno da natureza provocado pela auto-combustão de restos de grandes animais.
Qualquer que seja a versão do mito, é recomendado que a pessoa que encontrar um boitatá pelo caminho fique bem quieta e mantenha os olhos fechados, para não atrair o apetite voraz da cobra.
Interessante postagem
ResponderExcluirCreuza, achei muito interessante sua postagem...
ResponderExcluirEstou estudando sobre o folclore brasileiro para meu tcm da facu, e o conteúdo do seu post vai me ajudar muito a ter uma boa noção sobre os mitos.
Vlw mesmo pela ajuda "involuntária"
Fico feliz em poder te ajudar com este post, Tls. Ajudar as pessoas de alguma forma é sempre recompensador. Boa sorte com o trabalho. Um abraço.
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